Esta quarta-feira foi a vez de Paulo Portas se revelar enquanto ministro do novo governo. Depois de Assunção Cristas foi a vez de o MNE vir a público tentar melhorar a imagem do governo com mais uma reforma inovadora e um Ministro dinâmico jovem e energético - aonde é que já vimos isto? Ah pois...
Pelo menos foi essa a intenção ao se criar uma oportunidade mediática com Portas e o corpo diplomático que obteve ampla difusão - em directo em vários canais de televisão por cabo.
Enquanto internacionalista residente, este Psicótico vê a responsabilidade de comentar o espectáculo como implícita. Mais importante ainda, vejo esta análise como a mim consignada porque durante a era Socrática fiz questão de comentar a actuação do governo em política externa e tenho agora que ser consequente com o meu percurso.
Infelizmente, por muito que eu gostasse de poder afirmar que uma nova era se apresenta na condução da política externa do nosso país, as minhas conclusões são na sua maioria negativas. No entanto, por muito que me custe observar os mesmos erros de sempre a serem cometidos (e custa, acreditem), posso pelo menos orgulhar-me de ser consequente com opiniões que tenho expressado ao longo dos anos.
O Ministro Portas fez um discurso longo em prol da diplomacia económica mas enganem-se aqueles que pretendam elogiar uma nova abordagem à diplomacia pois não só não é a diplomacia económica algo de novo - o termo já nos é transmitido bem gasto, pelos sectores económicos Americano e asiático - mas não é tão pouco algo de novo em Portugal. Os governos Sócrates sempre pugnaram pela abordagem económica à política externa e só quem não recorda os périplos de Sócrates e Amado pelo mundo Árabe, pela América Latina e pela China é que poderia sequer sonhar em atribuir a Portas e ao XIX Governo Constitucional o mérito do conceito.
Pois bem, nenhuma novidade mas se o conceito é bom aonde está motivo para crítica? O conceito é desde logo problemático porque eu comento de acordo com uma perspectiva política e o termo é técnico. Há uma grande diferença entre diplomacia e política externa: a primeira é táctica e técnica, a segunda é (ou deveria ser) estratégica e política. Mas deixando a semântica de lado, o problema que se põe de imediato é saber qual a estratégia por detrás desta política e a minha análise é negativa sobretudo devido ao facto de o discurso do governo não ter deixado antever qualquer estratégia - muito pelo contrário, parece não querer dar importância à necessidade de uma.
A intenção é simples: fazer negócio o mais possível. Mas o Estado Português não é uma empresa, é uma entidade política. Não sou contra abrir oportunidades ao empreendedorismo e facilitá-lo mas essa é a função do Ministério da Economia. Os diplomatas Portugueses podem ajudar mas não são treinados (nem devem) para ser gestores.
Passo a explicar: que aconteceria se empresas Chinesas e Americanas estivessem ambas interessadas na aquisição da EDP? Aparentemente, de acordo com o paradigma aestratégico do governo, o critério seria 'first come, first served'. Ora isto é ausência de visão. Isto é imediatismo irresponsável e desprezo para com o interesse nacional - o qual é intrinsecamente de longo prazo. Isto é diplomacia de manga de vento pois significa governar ao sabor do vento.
Um dos pontos que foi corajosa e orgulhosamente avançado foi o de que a avaliação das missões diplomáticas de Portugal seria agora regido pelo critério das relações comerciais. Uma vez mais isto revela a total ausência de visão ou planeamento estratégico pois vejamos o exemplo do massacre de Santa Cruz: se fosse hoje, Portugal não se bateria pela independência de Timor-leste pois o volume de negócios com a Indonésia é e será sempre superior ao das trocas comerciais com o pequeno Timor.
Tudo isto resulta claro da falta de um Conceito Estratégico Nacional. Claro que quando se decide ser escravo da narrativa politicamente correcta de fim-de-História demo-liberal, percebe-se que haja alguma ...'hesitação' em definir ameaças, imperativos estratégicos e critérios de política externa; é chato fazer escolhas pois escolhas implicam decisões, decisões implicam riscos e tomar riscos exige coragem. É tão mais confortável andar ao sabor da maré e esperar pelo melhor...
Mas a outra principal razão não é estrutural e sim de liderança: como avisei ao longo dos últimos anos, o percurso de alguns dos líderes deste governo nunca me inspirou esperança em ver grandes estadistas dali emergir. Detesto dizê-lo mas ...'eu avisei'.
Confesso que durante algum tempo mantive alguma esperança de que este governo pudesse ser diferente quando ao apresentar os seus planos de governo decidiu pôr o vector da Lusofonia à frente de o do Atlantismo e de o da Europa. Gostaria que quem quer que seja que tenha sido pro-activo o suficiente para argumentar a favor de uma hierarquia estratégica diferente para a nossa política externa, fosse agora coerentemente mantido à frente de uma reforma do MNE. Gostaria...