UV 2010: Dia 4, parte II
O mesmo desafio para a Lília Bispo Martins.
A Implantação da República em Portugal
Confesso que foi com um misto de entusiasmo e apreensão que acedi ao repto lançado pelo Psicolaranja para colaborar na redacção de um artigo dedicado à Implantação da República em Portugal.
Analisando o contributo que efectivamente poderia dar sobre esta matéria, verifico que a minha melhor colaboração seria uma visão pessoal e simples daquilo que apreendi nos últimos dias e que considero ter sido o legado que a história portuguesa nos deixou.
Se atentarmos ao que a história nos diz, verificamos que, no fundo, a mudança de regime não foi tão profunda quanto seria necessária e desejada. Na verdade, a passagem da Monarquia Constitucional para a 1.ª República, ocorrida por via de um movimento revolucionário de militares da marinha e do exército, coadjuvado pela Carbonária e pelas estruturas do Partido Republicano Português, assumiu contornos essenciais que justificam o que acabo de dizer e que, por essa via, acabam por ser paradoxais:
1 - A Laicização do Estado: A laicização do Estado foi ocasionada pela Lei que operou a separação entre a Igreja e o Estado, aprovada pelo Governo Provisório da República a 20 de Abril de 1911. No entanto, essa lei foi corolário de uma minoria intelectual, já que grande parte da população era católica e contra essa alteração. Pese embora a religião católica tenha deixado de ser a religião do Estado, a República continuou a manter restrições ao culto público.
2 – Direito das mulheres/Direito ao voto: A 1.ª República introduziu o direito ao divórcio, ao casamento civil, mas foi também o regime que interditou, o direito ao voto por parte das mulheres. Essa consagração ficou explícita na nova lei eleitoral emitida durante o governo a que presidiu Teófilo Braga, na qual ficou assente o direito ao voto “a todos os adultos do sexo masculino”; Contudo, a verdade é que a própria monarquia constitucional já o reconhecia a priori, pelo que a sua interdição poderá ser entendida não como uma evolução, mas como um retrocesso.
Paralelamente, existiram também algumas curiosidades decorrentes da 1.ª República e que merecem ser partilhadas:
1 – A 1.ª República não introduziu o sufrágio universal;
2 – A instauração da 1.ª República ocorreu, em diversos países, entre as 1.ª e 2.ª Guerras Mundiais, bem como o primeiro regime comunista (1917) e o primeiro regime fascista (1922);
3 - A Avenida Almirante Reis em Lisboa deve o nome a um dos líderes da revolta que conduziu Portugal em 1905 à 1.ª República que, achando estar esta perdida, se suicida naquela mesma rua, falhando por horas a alegria do sucesso do golpe que ajudara a preparar.
4 - Onze anos depois da Implantação da República, percorreu Lisboa uma “camioneta fantasma” com uma missão macabra que, a coberto do golpe revolucionário, assassinou altos representantes da Nação, não tendo sido fácil a implementação do novo regime.
Estes foram alguns dos elementos que foram fonte de debate e ponto de reflexão em mais uma jornada da Universidade de Verão, no qual os jovens tiveram de fazer uma apresentação de trabalhos alusivos ao Centenário da República.
Como se viu, essa partilha de conhecimentos e de saber, permitiu uma visão mais crítica e mais real do que foi a 1.ª República, razão pela qual a partilho hoje convosco.
Por último, termino com uma citação de Eça de Queirós: “As revoluções não são factos que se aplaudam ou se condenem. Havia nisso o mesmo absurdo que em aplaudir ou condenar as evoluções do Sol. São factos fatais. Têm de vir. De cada vez que vêm é sinal que o homem vai alcançar mais uma liberdade, mais um direito, mais uma felicidade”.
Lília Bispo Martins